
A Independência do Brasil reúne uma série de significados sobre a sociedade colonial, incluindo a seleção e a criação de versões dos fatos históricos considerados mais relevantes para a formação da ideia de nação. Também representa o protagonismo de mulheres e homens que, naquele tempo, se envolveram neste processo permeado de acontecimentos em todo o país. O movimento de independência do Brasil não foi um ato único e, tão pouco, sem violência e centralizado no Rio de Janeiro, capital à época. Os movimentos de rebelião, insurreição e revolução foram inúmeros e em diversos momentos e lugares do Brasil.
A cada nova geração, temos a oportunidade de ressignificar os eventos e pessoas que faziam parte daquela geração. Além do icônico evento registrado em pintura, de Dom Pedro I proclamando a Independência do Brasil, podemos descortinar a participação de grupos invisibilizados, como as mulheres. A lista de mulheres engloba algumas figuras consideradas heroínas em algum momento da história e personalidades silenciadas que são reverenciadas por estudiosas(os) e curiosas(os) sobre o tema.
Bárbara Pereira de Alencar
Bárbara Pereira de Alencar é considerada a primeira mulher presa política do Brasil e foi uma das primeiras republicanas do país, chegando a ser considerada por alguns como a primeira presidenta de uma república independente.
Inspirada em conceitos iluministas e a favor da independência, viveu a maior parte de sua vida em Crato, no Ceará, onde comandou a Revolução de 1817. Na ocasião, liderou o povo para a ocupação da Câmara Municipal da cidade, o que levou à sua prisão.
Quatro anos após depois, ela e outros envolvidos na rebelião foram anistiados. Após seu retorno, continuou com seu envolvimento e liderança política e se envolveu na Confederação do Equador, que se instaurou em julho de 1824.
A família Alencar foi perseguida e alguns de seus membros, assassinados. Bárbara se tornou avó do escritor José de Alencar e foi incluída no “Livro dos Heróis e Heroínas da Pátria''.
Joana Angélica
Joana Angélica, abadessa do Convento da Lapa, em Salvador (BA), resistiu à entrada de soldados portugueses no Convento. Os soldados, que estavam em busca de armas e brasileiros, foram barrados pela abadessa, que resistiu até ser morta pelos soldados.
Hipólita Jacinta Teixeira de Melo
Hipólita Jacinta Teixeira de Melo fez parte da resistência que iniciou o levante que ficou conhecido como Conjuração Mineira. Foi uma das lideranças e tomou o protagonismo da Conjuração, principalmente após a morte de Tiradentes. Em mensagem para as pessoas envolvidas no movimento de insurreição, disse: “Quem não é capaz das coisas, que não se envolva. Mais vale morrer com honra, que viver com desonra”.
Como parte da elite mineira e proprietária de fazendas, Hipólita traçou, desde criança, um caminho distinto ao esperado por uma mulher na época. Apesar de os conjurados terem sido presos como resposta ao movimento, Hipólita não foi detida, mas perdeu todos os seus bens.
Para contornar a situação, alegou que parte do patrimônio era herança de seu pai, o que a permitiu reaver alguns de seus bens, como fazendas, lavras e escravos.
Maria Felipa de Oliveira
Maria Felipa de Oliveira foi uma mulher negra, capoeirista, pescadora e marisqueira da Ilha de Itaparica (BA), além de revolucionária. A Ilha de Itaparica foi considerada um ponto estratégico nas batalhas, pois estava entre Salvador e o Recôncavo Baiano. O controle da ilha permitiria que os portugueses minassem a resistência brasileira instalada no Recôncavo Baiano, que não teria mais acesso à principal rota de recebimento de suprimentos.
Maria Felipa liderou um batalhão de mulheres denominado Vedetas e tornou-se a principal estrategista contra a ocupação portuguesa na região. Foi capaz de organizar em pequenos barcos a continuidade de suprimentos endereçados aos grupos de resistência no Recôncavo e uma ofensiva que queimou diversas embarcações portuguesas próximas à ilha. Maria Felipa foi incluída no “Livro dos Heróis e Heroínas da Pátria''.
Maria Quitéria
Maria Quitéria tornou-se a mulher protagonista da Independência mais famosa pela sua atuação nas batalhas pela independência. Foi uma personagem emblemática e reconhecida por se vestir de homem para lutar. Vestindo o uniforme de seu cunhado, lutou em batalhas na cidade de Salvador como um soldado, o soldado Medeiros. Pela sua atuação, foi reconhecida na época e recebeu a honra de Primeiro Cadete pelo general Labatut.
Por seus feitos, Dom Pedro I lhe concedeu o soldo de Alferes de Linha e a insígnia de Cavaleiro da Ordem Imperial do Cruzeiro. Pela celebração ao centenário de sua morte, foi erguida uma estátua de Maria Quitéria em Salvador em 1953. Em 1996, foi reconhecida como Patronesse do Quadro Complementar de Oficiais do Exército Brasileiro.
Maria Leopoldina
Maria Leopoldina, conhecida por ser a Imperatriz do Brasil, foi esposa de Dom Pedro I e atuou ativamente para a decisão do imperador em acatar a independência do Brasil. Atuava como regente durante as ausências do marido e, no dia 2 de setembro de 1822, assinou o Decreto que declarou a Independência do Brasil. Este decreto foi enviado para Dom Pedro I, que declara a independência no dia 7. Mesmo que interinamente, Maria Leopoldina esteve como a primeira mandatária do Brasil independente.
Urânia Vanério
Urânia Vanério, a baianinha, era uma menina quando testemunhou o ataque de portugueses em Salvador e começou a relatar em versos o que viveu. Publicou, como anônima, o panfleto “Lamentos de uma Baiana”, no qual dizia que a obra trazia os “os lamentos de uma baiana na triste crise, em que viu sua pátria oprimida pelo despotismo constitucional da tropa Auxiliadora de Portugal”.
Passaram-se gerações para se descobrir a autoria do panfleto. Urânia Valério fez da pena e da escrita suas armas contra o domínio colonial português.
Conclusão
O reconhecimento com a produção historiográfica sobre as mulheres, pela sociedade e pelo Estado, é fundamental para a celebração, a valorização e a compreensão do papel da mulher na sociedade colonial e pós-colonial. Serve também para a descoberta de outras mulheres que contribuíram de diversas formas para o desenvolvimento da independência e da própria sociedade brasileira.
As mulheres aqui relatadas são somente uma amostra das mulheres que atuaram pela construção de um Brasil como nação independente. Muitas outras merecem estar no Panteão das Mulheres da Independência. A voz e a presença das mulheres ainda hoje carecem de escritos e maior valorização. Relembrando suas vidas e trajetórias, tornamos essas mulheres percebidas e homenageadas e conseguimos resgatá-las do esquecimento.
7 de setembro de 1822, demarcado como a data de nossa independência, foi vivenciado e protagonizado por mulheres que, naquele momento, não se contentavam com sua posição de subalternidade. São mulheres precursoras, vanguardistas e nossas ancestrais. Nos inspiram, ensinam e nos dão confiança para continuar com nossas batalhas diárias por igualdade de oportunidades e respeito para todas as mulheres.