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  • Foto do escritorLorena Castro e Kassia Nogueira

Semana do Consumidor: Pessoas jurídicas podem ser enquadradas como consumidoras?


Em 15 de março é comemorado o Dia do Consumidor. Sua origem remonta ao ano de 1969, quando o então presidente dos Estados Unidos, John F. Kennedy, implementou uma política nacional de direitos do consumidor. A fim de globalizar a proteção ao consumidor, em 1983, a Assembleia Geral da ONU internalizou oficialmente a data comemorativa, e, desde então, diversos países vêm promovendo a data com o intuito de conscientizar o mercado e a população acerca da importância de proteção ao consumidor.


Afinal, quem pode ser considerado consumidor?


Nos termos do artigo 2° do Código de Defesa do Consumidor (CDC), considera-se consumidora toda pessoa física ou jurídica que adquire ou utiliza produto ou serviço como destinatário final.


O referido artigo consagra a “Teoria Finalista”, segundo a qual considera-se como destinatário final aquele que retira o produto do mercado e o utiliza em proveito próprio.


Este entendimento é formulado a partir de uma interpretação restritiva do art. 2º do CDC, em que se desconsidera dentre os destinatários finais, aqueles que, de alguma forma, adquirem algum produto ou serviço com intuito profissional, isto é, com a finalidade de integrá-lo no seu próprio processo de produção, transformação ou comercialização.


E é a partir disso que surge uma grande controvérsia: como poderia uma pessoa jurídica ser considerada como consumidora?


Nota-se que, segundo a teoria finalista pura, as empresas apenas poderiam ser enquadradas como consumidoras caso o produto ou serviço adquirido seja para uso próprio. Não obstante, mesmo com esta interpretação, muitas empresas ainda eram preteridas do enquadramento como consumidoras, sob a justificativa de que ao adquirir um produto ou serviço, estes, de algum modo, complementariam seus resultados perante seus consumidores.


Significava dizer que, desde um contrato de fornecimento de energia, até a aquisição de produtos eletrodomésticos, se tais insumos, de alguma forma contribuíssem para a atividade empresarial, as empresas estariam automaticamente descaracterizadas como destinatárias finais de fato.


Por outro lado, a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça[1], instância máxima em matéria infraconstitucional, vem adquirindo contornos diferentes. Passou-se a abranger dentre os destinatários finais todos os consumidores por equiparação, o que representou uma evolução da teoria finalista pura para a aplicação temperada da Teoria Finalista, também denominada Teoria Finalista Aprofundada ou Mitigada.


A partir da equiparação, passa-se a admitir que, em determinadas hipóteses, as pessoas jurídicas, quando apresentem frente ao fornecedor alguma vulnerabilidade, sejam consideradas consumidoras, mesmo que os produtos ou serviços adquiridos sejam utilizados para alavancar sua atividade. A noção de vulnerabilidade constitui o princípio-motor da política nacional das relações de consumo, premissa expressamente fixada no art. 4°, I, do CDC, que legitima toda a proteção conferida ao consumidor às pessoas jurídicas.


Assim, com a aplicação da Teoria Finalista Mitigada ou Aprofundada, mesmo que certa pessoa jurídica não possua a característica de destinatário final, a verificação de sua vulnerabilidade quando da contratação de produtos ou serviços é suficiente para a aplicação do regime jurídico do consumidor. À vista disso, o doutrinador Paulo R. Roque[2] enfatiza que os julgados que entendem pela aplicação da Teoria Finalista Mitigada condicionam a proteção do CDC ao consumidor profissional desde que este seja capaz de demonstrar a vulnerabilidade técnica, jurídica ou econômica.


Mas em que aspecto uma pessoa jurídica pode ser considerada vulnerável?


A doutrina tradicionalmente aponta a existência de três modalidades de vulnerabilidade: (i) a técnica, que consiste na ausência de conhecimento específico acerca do produto ou serviço objeto de consumo; (ii) a jurídica, consubstanciada na falta de conhecimento jurídico, contábil ou econômico e de seus reflexos na relação de consumo; e (iii) a fática, onde se encontram situações em que a insuficiência econômica, física ou até mesmo psicológica do consumidor o coloca em pé de desigualdade frente ao fornecedor. Mais recentemente, tem se incluído também a vulnerabilidade informacional, que ocorre quando não são disponibilizados dados suficientes sobre o produto ou serviço, influenciando no processo decisório de compra.


Enquadradas em uma dessas modalidades de vulnerabilidade, as empresas poderiam, enfim, gozar de toda a proteção consumerista concedida pela legislação pátria, mesmo que os produtos e/ou serviços adquiridos sejam aplicados como insumos para sua atividade empresarial.


Não obstante, no contexto de uma ação judicial movida por uma empresa insatisfeita com os produtos e serviços que adquiriu junto ao fornecedor, o juiz designado para o caso poderá reconhecer ou não a relação consumerista. Em certos casos, como, por exemplo, a compra de matérias-primas para processos industriais da empresa adquirente, é virtualmente impossível enquadrar a empresa adquirente como destinatária final desses produtos, assim como seria improvável considerá-la vulnerável se a compra diz respeito a insumos que ela adquire com habitualidade. Nessas situações, espera-se que seja reconhecida uma relação puramente comercial entre comprador e vendedor/fornecedor, em que não caberia falar em proteção especial para o consumidor.


Cabe aos tribunais pátrios, portanto, estabelecer balizas claras para a definição dos limites do conceito de consumidor aplicados a empresas, por meio da consolidação de uma jurisprudência pacífica sobre o assunto.

[1] STJ - REsp: 1195642 RJ 2010/0094391-6, Relator: Ministra Nancy Andrighi, Data de Julgamento: 13/11/2012, T3 - Terceira Turma.

[2] KHOURI, Paulo R. Roque A. Direito do Consumidor, p. 55. Editora Atlas LTDA: São Paulo/SP, 2020.

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